domingo, 19 de abril de 2009

CONVERSA NA BALI por Carlito Lima


Maceió, como toda cidade nordestina, tem saborosos sorvetes como tradição e cultura gastronômica e animadas sorveterias como ponto de encontro, consequência do calor e de nossas frutas deliciosamente adocicadas que se prestam aos sucos e sorvetes.
Tenho ainda na lembrança o dia que meu pai comprou a primeira geladeira, Frigidaire, maior sucesso. Minha mãe, no almoço, fazia saborosos refrescos de mangaba, manga, abacaxi; o suco que sobrava do almoço nós colocávamos no congelador, era uma farra quando virava sorvete.
Na Praia da Avenida da Paz um sorveteiro, Seu Primitivo, rodava seu carrinho pela manhã entre os banhistas. Havia sempre duas qualidades de sorvete, coco e cajá, coco e goiaba, coco e mangaba; o de coco era invariável. Ele vendia fiado e cobrava em nossas casas pela tarde.
Nos anos 60/70 duas sorveterias fizeram a delícia da moçada no Centro da cidade: a DK-1 e a GUT-GUT, pontos de conversa, de relaxamento, de desfile das belas jovens cheias de hormônios que esfriavam o calor externo e o interno lambendo deliciosos sorvetes. Quantos namoros, quantas paqueras se deram naquelas tardes mornas nas sorveterias dos anos
dourados!
Essas histórias de sorvetes eram assuntos da conversa domingo passado na Bali, orla da Pajuçara. A sorveteria tornou-se ponto de encontro, local agradável, mesas de metal limpíssimas, todo tipo possível de sorvete. São mais de 70 qualidades, além dos diets. O sorvete de pinha é meu predileto, depois sapoti, mangaba... Maceió está bem de sorvete, além da Bali, Alberto Cabus revolucionou a indústria de gelados. A fábrica de sorvete Fika-Frio compete com a Nestlé e a Kibon; entre outras delícias, produz o picolé de tapioca, o melhor picolé do Brasil, excelência em matéria de sorvete.
Imperdível na Sorveteria Bali é a roda de papo, a prosa acarinhada pela brisa marítima. Geralmente vou com o amigo Majella de três a quatro vezes por semana. Nos sentamos por volta das cinco da tarde, o papo prolonga-se até 9 ou 10 da noite; outros amigos agregam-se na roda. Na Bali se vê de tudo: gente famosa como o Galvão Bueno, a Daniela Cicarelli, e muita mulher bonita. Turistas saem da praia com suas cangas charmosas para saborear um sorvetinho em ambiente descontraído. É bom apreciar, ver mulher bonita, faz bem aos olhos. Autoridades não faltam na Bali. São constantes frequentadores o deputado Augusto Farias, o ex-governador Ronaldo Lessa aparece para esfriar a cabeça e um papo. Domingo passado, Téo Vilela tomava sorvete com sua bela filha, sozinho, sem algum segurança, sentou-se numa mesa na calçada; o governador cumprimentava os
conhecidos.
Em nossa mesa, rola todo tipo de conversa, principalmente falar mal do governo, seja qual for; o papo vai de filme, música, à mulher bonita, prosa variada e inteligente, divertida. Não se nota o tempo passar, nem que estamos ocupando mesa, clientes ficam à espera, e nós nem aí. Além do gostoso sorvete, existe a gentileza de Carlos e Lia, os proprietários. O casal veio a Maceió a passeio, ficaram, montaram a Bali há 19 anos, aqui permaneceram, são alagoanos por opção e fazem parte da
cidade.
Em 2008, a revista Veja elegeu os melhores da cidade e fui jurado na escolha dos bares. A Bali ganhou por unanimidade como a melhor sorveteria. É mais que isso. É ponto de cultura gastronômica e de encontro de intelectuais, políticos, aposentados e outros desocupados; faz parte de nossa cidade.
Não posso deixar de registrar um acontecimento com José Santos, vendedor de DVDs piratas, que ronda as casas noturnas da cidade. Domingo passado, na Bali, escolhi alguns filmes para a Semana Santa. 8 filmes, R$ 26,00, barato que nem banana em fim de feira. Dei-lhe uma nota de R$ 20,00 e mais três notas de R$ 2,00. Meia hora depois José Santos retorna reclamando que lhe dei dinheiro errado. Me devolveu uma nota de R$ 100,00; eu havia confundido com uma nota de R$ 2,00 (mesma
cor).
Fiquei comovido com a simplicidade honesta do José dos Santos. Lembre-se desse nome, ele é o maior dos brasileiros, é povo que é bom e correto. Esse singelo e significativo fato trouxe-me alegria, esperança e a certeza de que nem tudo está perdido, existem muitos José Santos, o mais brasileiro de todos os brasileiros.

(GAZETA DE ALAGOAS – DOMINGO – 19/4/2009)

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