segunda-feira, 27 de abril de 2009

CLUBE FENIX ALAGOANA por Lelé

Sexta-feira passada, dia 24, fomos a uma feijoada na Fenix, um convescote de político, oferecido pelo nosso amigo Guilherme Palmeira ao não menos amigo Roberto Mendes, em desagravo a dispensa de Roberto da secretaria de Esporte do Governo do Estado. Gente pro cacete. Lotou o pátio onde era a quadra de esporte descoberta do clube. Fazia tempo que eu não pisava ali. De lado, a piscina, onde hoje existem raias para a prática de natação. Foi minha primeira recordação.

Estudava Engenharia em Recife nos meados dos anos 60
, e esporadicamente, quando a saudade apertava, vinha a Maceió em finais de semana. Claro que seco prá chegar na praia da avenida, me encontrar com a turma. Lá prá tardinha, a gente como sócio, ia prá o clube Fenix tomar umazinhas, e neste horário encontrava a piscina fechada. Então eu pulava o alambrado e tibum... Aí em sucessivas vindas a Maceió, e sucessivos tibuns, peguei advertência, suspensão e finalmente expulsão. Foi o ocaso da Fenix na minha vida. Foi apenas o final do tempo feliz que passamos naquele clube.

Mais recordações vieram nesse convescote, principalmente quando encontrava os maloqueiros da época. Estavam lá vários avenidenses, como Mardem, Tinho, Carlito, Guilherme e Quico, e outros afins, que viviam na praia da Avenida, como o pessoal do Palmeiras: Cáo, Toinho bode, Fernando Soares, Walter Guimarães, Jair, e ainda Uchoínha, Sergio Nobre, Mauricio Breda, Chumbinho, Claílton, Marcello Barros, Vadinho, Esdras, Fernando Ganso, Roberto Arainha, Murilo Marinho, Batinga, Bionor, Cir
idião, Flavio Gomes Barros com seu pai Maru, que quando o provoquei dizendo que ele só jogava na banheira no futebol dos Perrelli, em frente ao hotel Atlântico, me contou a seguinte história: na pelada dos Perrelli, deu uma porrada sem querer em Abrahão Moura, brabo que só a gota, e ele subiu prá avenida, chamou um cara e disse “vá pegar minha pistola que vou dar um tiro naquele filho de uma égua”, apontando o Maru. O cara falou “meu patrão, aquele é neto de seu Laurentino Gomes de Barros”, um dos coronéis mais valente das Alagoas. Aí Abrahão recuou: “em vez da arma traga duas cervejas”, e convidou Maru prá tomar umazinha. Eram assim resolvidas as paradas na época.

A entrada no clube era uma história a parte. O porteiro Raimundo, tal qual nossa honrada justiça, era muito maleável. Dependia do seu humor e do protagonista prá o cara entrar na Fenix. Uma vez Mourinha, nosso vizinho na Silvério Jorge, foi entrando dizendo que era filho do Cabeção, o homem do jogo do bicho, nadava na grana; seu Raimundo retrucou “pode ir dando meia volta que o Cabeção não é sócio daqui, não”. Outra vez, cheguei prá Mardem Melé e disse prá ele falar que era meu irmão. Eu entrei no clube, e logo atrás veio Melé. Raimundo perguntou “e você é filho de quem?”. Melé gaguejou: “ sô- sô- sô fi-fi-filho do me-mesmo pai dele”, apontando prá mim. O porteiro tava de bom humor, deu uma gargalhada e deixou Melé passar. Dizem, que certa noite, Fernando Collor chegou com três mulheres para entrar num baile da Fenix. Seu Raimundo chamou o Fernando de lado e comentou “ Prefeito, essas mulheres são suspeitas”, e recebeu a seguinte resposta “ suspeitas são as que estão aí dentro, essas são putas mesmo...” , e entraram todos, claro.

A vida esportiva de nossa adolescência, além das nossas peladas na praia, era vivida no clube Fenix. Ali era onde tinham as quadras de vôlei e basquete, e depois a de futebol de salão, inaugurada exatamente pelos meninos da
avenida, no jogo Atlântico e Tênis, preliminar do jogo principal, Santa Cruz e Fenix. O infantil do Tênis era favorito, mas ganhamos o jogo por 3 X 2, com atuações magníficas de Cuca no gol, do gordinho Luciano na defesa, e do saudoso Hélio Miranda como técnico. Fiz o gol da vitória, fui carregado pelos colegas e meu pai caiu da arquibancada no entusiasmo. Foi a minha glória esportiva.

Além de futebol de salão, jogávamos vôlei e basquete, e praticávamos natação. Íamos assistir as feras da época no ginásio da Fenix: as sestas de Carlos Paes, Batinga, Lica Doido e Arroxelas; as porradas de Ascânio Urubu, Walter Pé-de-tábua, Fernando Ganso e Iv
aldo Gatto no vôlei. Bianor era reserva do time de vôlei da Fenix. Quando o time estava perdendo a canalha gritava da arquibancada: “bota Bianor, bota Bianor”, quando ele entrava na quadra a gente já ia gritando: “tira Bianor, tira Bianor”. Certa vez ele perdeu a esportiva e saiu correndo atrás da gente, mas nossas canelas eram mais rápidas. O nosso amigo avenidense Adilson, o Cuíca, num jogo de futebol de salão, começou a berrar “queremos pau, queremos pau”. A galera deu a maior vaia. Ele olhou pra um lado, só tinha neguinho marrento, olhou pró outro, enxergou um baixinho esquelético, falou prá cima dele “quequié, nunca viu homem não?”. Aí foi que a vaia dobrou. A arquibancada da quadra da Fenix era um divertimento a parte.

Mas o melhor do clube Fenix eram suas festas. Eram contratadas orquestras espetaculares e famosos artistas nacionais. Lembro que uma vez Agostinho do Santos veio cantar na Fenix e se hospedou na casa de seu Dalmo Peixoto na Avenida. Era gente muito boa, bateu zorra com a gente na praia, calçando um tênis, era estranho aquilo na época. Outro que veio também foi Caub
i. Um dos nossos amigos avenidenses disse que no banheiro do clube o cantor fez a festa em meio dúzia de moleques, incluindo ele.

O réveillon era imperdível. Depois de romper o ano em casa, a elite maceioense, ia comemorar na Fenix. Mas a grande festa mesmo era o carnaval. Não podíamos imaginar carnaval sem as festas da Fenix. Começava já em janeiro com o baile de Máscara, com premiação de fantasia, folião, etc. e os prêmios eram lanças perfumes, depois vinham os bailes pré-carnavalescos Preto e Branco, Noite do Havaí,... e nos dias propriamente de carnaval as Matinais e soirés, sempre com Claudionor Germano comandando a festa: “ ... não pense que estou triste n
em que vou chorar, eu vou cair no frevo que é de amargar”. Foram nessas festas, ao som de Capiba, que nossa geração deu seu primeiro beijo, teve seu primeiro alumbramento sexual, tomou seu primeiro porre de dor de corno.

Todo mundo andava com sua lança Rodouro na festa. Tínhamos o nosso cantinho perto da piscina prá tomar porre. Numa
matinal da Fenix, estávamos eu e Emilio no cantinho, com o lenço encharcado de lança no nariz. Quando a gente começava a ouvir apenas o bumbo da orquestra, Tum – Tum – Tum, como som de maracatús desgarrados, era sinal da hora de parar de cheirar. Saindo do porre, vejo Emilhão ainda com o lenço naquele nariz grande que Deus lhe deu, desmaiado. Me apavorei. Depois de alguns gritos “Emilhão”, chegou um amigo que não me lembro quem, prá me ajudar, e logo em seguida, Emílio volta do porre. Susto do cacete. Fazia parte de nosso carnaval. Voltamos pro salão, mas Claudionor já estava cantando “... Oh, quarta-feira ingrata, chega tão depressa, só prá contrariar.” E a quarta-feira de cinzas do carnaval de Maceió veio com o término dos bailes da Fenix. Foi um clube que passou na vida dos avenidenses.

domingo, 19 de abril de 2009

CONVERSA NA BALI por Carlito Lima


Maceió, como toda cidade nordestina, tem saborosos sorvetes como tradição e cultura gastronômica e animadas sorveterias como ponto de encontro, consequência do calor e de nossas frutas deliciosamente adocicadas que se prestam aos sucos e sorvetes.
Tenho ainda na lembrança o dia que meu pai comprou a primeira geladeira, Frigidaire, maior sucesso. Minha mãe, no almoço, fazia saborosos refrescos de mangaba, manga, abacaxi; o suco que sobrava do almoço nós colocávamos no congelador, era uma farra quando virava sorvete.
Na Praia da Avenida da Paz um sorveteiro, Seu Primitivo, rodava seu carrinho pela manhã entre os banhistas. Havia sempre duas qualidades de sorvete, coco e cajá, coco e goiaba, coco e mangaba; o de coco era invariável. Ele vendia fiado e cobrava em nossas casas pela tarde.
Nos anos 60/70 duas sorveterias fizeram a delícia da moçada no Centro da cidade: a DK-1 e a GUT-GUT, pontos de conversa, de relaxamento, de desfile das belas jovens cheias de hormônios que esfriavam o calor externo e o interno lambendo deliciosos sorvetes. Quantos namoros, quantas paqueras se deram naquelas tardes mornas nas sorveterias dos anos
dourados!
Essas histórias de sorvetes eram assuntos da conversa domingo passado na Bali, orla da Pajuçara. A sorveteria tornou-se ponto de encontro, local agradável, mesas de metal limpíssimas, todo tipo possível de sorvete. São mais de 70 qualidades, além dos diets. O sorvete de pinha é meu predileto, depois sapoti, mangaba... Maceió está bem de sorvete, além da Bali, Alberto Cabus revolucionou a indústria de gelados. A fábrica de sorvete Fika-Frio compete com a Nestlé e a Kibon; entre outras delícias, produz o picolé de tapioca, o melhor picolé do Brasil, excelência em matéria de sorvete.
Imperdível na Sorveteria Bali é a roda de papo, a prosa acarinhada pela brisa marítima. Geralmente vou com o amigo Majella de três a quatro vezes por semana. Nos sentamos por volta das cinco da tarde, o papo prolonga-se até 9 ou 10 da noite; outros amigos agregam-se na roda. Na Bali se vê de tudo: gente famosa como o Galvão Bueno, a Daniela Cicarelli, e muita mulher bonita. Turistas saem da praia com suas cangas charmosas para saborear um sorvetinho em ambiente descontraído. É bom apreciar, ver mulher bonita, faz bem aos olhos. Autoridades não faltam na Bali. São constantes frequentadores o deputado Augusto Farias, o ex-governador Ronaldo Lessa aparece para esfriar a cabeça e um papo. Domingo passado, Téo Vilela tomava sorvete com sua bela filha, sozinho, sem algum segurança, sentou-se numa mesa na calçada; o governador cumprimentava os
conhecidos.
Em nossa mesa, rola todo tipo de conversa, principalmente falar mal do governo, seja qual for; o papo vai de filme, música, à mulher bonita, prosa variada e inteligente, divertida. Não se nota o tempo passar, nem que estamos ocupando mesa, clientes ficam à espera, e nós nem aí. Além do gostoso sorvete, existe a gentileza de Carlos e Lia, os proprietários. O casal veio a Maceió a passeio, ficaram, montaram a Bali há 19 anos, aqui permaneceram, são alagoanos por opção e fazem parte da
cidade.
Em 2008, a revista Veja elegeu os melhores da cidade e fui jurado na escolha dos bares. A Bali ganhou por unanimidade como a melhor sorveteria. É mais que isso. É ponto de cultura gastronômica e de encontro de intelectuais, políticos, aposentados e outros desocupados; faz parte de nossa cidade.
Não posso deixar de registrar um acontecimento com José Santos, vendedor de DVDs piratas, que ronda as casas noturnas da cidade. Domingo passado, na Bali, escolhi alguns filmes para a Semana Santa. 8 filmes, R$ 26,00, barato que nem banana em fim de feira. Dei-lhe uma nota de R$ 20,00 e mais três notas de R$ 2,00. Meia hora depois José Santos retorna reclamando que lhe dei dinheiro errado. Me devolveu uma nota de R$ 100,00; eu havia confundido com uma nota de R$ 2,00 (mesma
cor).
Fiquei comovido com a simplicidade honesta do José dos Santos. Lembre-se desse nome, ele é o maior dos brasileiros, é povo que é bom e correto. Esse singelo e significativo fato trouxe-me alegria, esperança e a certeza de que nem tudo está perdido, existem muitos José Santos, o mais brasileiro de todos os brasileiros.

(GAZETA DE ALAGOAS – DOMINGO – 19/4/2009)