terça-feira, 19 de março de 2013

COMO CONSEGUI AMOLECER... por Paulo Ramalho



COMO CONSEGUI AMOLECER O CORAÇÃO DE UM GERENTE, ZELOSO, EFICIENTE, DURÃO, DO BANCO DO BRASIL, E POETA NAS HORAS VAGAS.

Em 1981, trabalhava no escritório de uma usina de açúcar em Maceió, que operava na Agência do Banco do Brasil em Atalaia, jurisdição da indústria, e tinha como gerente Jader Tenório.

Os financiamentos de entressafra já estavam devidamente aprovados com os respectivos cronogramas de liberação.
O ideal para o Banco, era liberar em sua totalidade, quando da aprovação, mas......

Fui convocado por um dos Diretores, para ir ao BB-Atalaia, solicitar ao Gerente, uma antecipação de liberação, pois os compromissos daquela semana estavam totalmente descobertos.

Fui a Atalaia, apresentei o problema ao Gerente, que de  imediato falou da impossibilidade, pois estava com uma fiscalização realizada pelo Sr. Barroso, fiscal do Banco, caso ele finalizasse a fiscalização até o final da semana, ele liberaria.
Eu sabia que não havia impedimento, uma vez que  a fiscalização é realizada de determinada data para traz, e o Gerente tinha total autonomia para liberar, caso houvesse alguma irregularidade, a canetada seria na próxima fiscalização.

Mas, prudentemente não insisti, porque ele poderia dizer que como não havia liberação prevista para a semana, não iria liberar, ai fechava o tempo.

Voltei à Maceió e disse ao Diretor que o Gerente estava irredutível, então ele me pediu que voltasse no outro dia para insistir, porque não havia recursos nem para o pagamento do pessoal.

Fui para casa e me isolei no gabinete escrevi o verso que segue, e ao chegar logo cedo ao escritório, pedi a telefonista que fizesse uma ligação com Jader Tenório, que ao ouvir disse que pedido feito em verso a um poeta é impossível negar.

Numa semana tão decisiva,
Exigindo de nós todo arrojo,
              Depender de JADER nos tranqüiliza,
                Nos preocupa é depender da saída do
                           Barroso.
                                                                    (29.07.1981)

Em função desse verso, desencadeou os a seguir, cronologicamente apresentados:

Meu caro Paulo Ramalho,
Eu gostei do seu repente.
Sua glosa me enrolou,
e comoveu ao Gerente,
pois pedido feito em verso,
não há poeta que agüente.

Pensei que Ouricurí,
Não precisava de ajuda,
Mas vejo que a situação,
está um Deus nos acuda,
a coisa está mais preta,
que consciência de Juda.

Tenho mesmo que agir,
com excesso de atrevimento,
passar por cima de tudo,
e amenizar um sofrimento,
e dizer para você,
que amanha venha ver,
o dinheiro do pagamento.

Diga ao compadre Adelmy,
João Cordeiro e Bastião,
que eu gosto de ajudar,
dentro da programação.
Quando eu nego um pedido,
já está tudo fudido,
e não tem jeito mais não.  
    (Jader Tenório)


Vou findar sendo poeta até jeitoso,
Se toda vez que para o JADER telefonar,
Quando da estada do Barroso,
Ser obrigado a fazer verso e rimar.

Fiquei totalmente humilhado,
Diante de sua sabedoria,
Devia ter ficado calado,
E não bulir com quem não devia.

Não o conhecia como poeta matreiro,
Sabia que era gerente eficiente e malicioso,
Que não querendo liberar o dinheiro,
Usou o nome do Barroso.

Mas a consciência doeu,
E ao ouvir a minha rima,
De imediato cedeu,
Ajudando a folha semanal da Usina. (Paulo Ramalho 30.07.1981)


Meu grande Paulo Ramalho,
Foi boa sua interferência,
Cantou-me em Poesia,
e eu  perdi a paciência,
Caí na sua enrolada,
A parcela foi liberada,
Viva a sua inteligência.

Você pegou o meu fraco,
e me enrolou pode crer,
Fez verso simples e profundo,
Tentado me convencer.
Disse que eu era matreiro,
Seu enrolão verdadeiro,
Cabra matreiro é você.

Notei que você é vivo,
Calculista e perigoso,
Trambiqueiro e enrolão,
Meio vigarista e manhoso,
E vem prá cima de mim,
Querendo botar assim,
Toda culpa no Barroso.

Toda essa esculhambação,
É para você aprender,
Que com poeta ninguém brinca,
Só que eu brinco com você.
Prá Adelmy e João,
Zé Pontes e Bastião,
Mando tudo a P.Q.P.     
  (Jader Tenório)


La vem eu novamente,
Com minha rimação,
Não deve ser coisa diferente,
Só pode ser antecipação de liberação.

Espero que desta vez não seja moroso,
E diga logo se libera ou não,
Lembre-se que não pode mais dá  desculpa do Barroso,
Porque ele já terminou a fiscalização.

Como amigo quero me desculpar,
Mas não tenho culpa não,
É que o infeliz do Barroso,
Só rima com manhoso,moroso e não com espertalhão.

Voltando ao assunto da liberação,
De acordo com o cronograma de custeio,
Somente poderemos meter a mão,
Mais ou menos daqui há um mês e meio.
Porém como gerente  sei que tem autonomia,
Como pessoa grande coração,
E arranjará um jeito de nos tirar dessa agonia,
Dando em nós mais esse empurrão.        
 (Paulo Ramalho 04.08. 1981)

Estou para você  telefonando,
Neste final de agosto,
Para saber como estão andando,
As liberações dos financiamentos por nós proposto.
(Paulo Ramalho 21.08.1981 )

Se realmente for poeta,
Já tem a minha resposta,
Caso contrário não tem outra alternativa,
A não ser a de comer o que gosta. 
(Paulo Ramalho 28.08.1981)


                         Maceió, 07/03/2013

                         Paulo Ramalho

MEUS QUERIDOS TIOS DA FAMÍLIA NONÔ por Cuca



Outras pessoas que pela convivência contribuíram amiúde, para meu desenvolvimento cultural e de caráter, foram sem dúvida meus tios. Entretanto, hoje me sinto meio perdido, deveras confuso, pela drástica mudança de valores e de conceitos da atual geração.

Nos anos passados, havia um norte a ser almejado, sempre se levando em conta às qualidades naturais da honestidade, da dignidade, da coragem, da amizade familiar, da solidariedade, da hierarquia, do conhecimento e principalmente do respeito às autoridades e aos mais idosos.
A geração atual tem como primórdios o consumismo, a aparência, o egoísmo exacerbado, a covardia, a corrupção e o desrespeito amplo e irrestrito.

Atualmente, a ingerência do Estado sobre às pessoas, através do famigerado “direitos humanos “, admite que os filhos denunciem seus pais, caso sejam castigados por eles; ao invés das vitimas, os bandidos são protegidos pelo Estado, inclusive , financeiramente. O desmando e incentivo aos desonestos é explicito, o mesmo ocorrendo com as minorias; ser viado é moda e a palavra negro é preconceito, punida como crime inafiançável. Os medicamentos são fraudados, já não existe o compromisso da palavra dada, os contratos desrespeitados sem uma penalidade compatível, os crimes são praticados em tocaia, protegidos por mascaras e covardia; nosso país esta em coma moral.

Mas, voltando às boas lembranças, desejo tornar expresso o meu sentimento de gratidão a esses entes que ajudaram sobremaneira minha vida.

Inicio, forçando a memória a expor, minha ligação com tio ALOYSIO UBALDO DE SILVA NONÔ, que tinha como marca, a determinação e fidelidade. Iniciou sua carreira como funcionário do Banco do Brasil, quando gerente em Palmeira dos Indios, face às amplas e sinceras amizades, projetou-se na política, elegendo-se deputado federal por varias legislaturas , até ser cassado pelo regime militar, de modo absurdo; pois o causador do fato foi o coronel Adalto, que desejava candidatar-se e para facilitar, afastou todos os políticos prestigiados de Alagoas; mas, o tiro saiu pela culatra, tendo o referido coronel sido assassinado no quartel, antes de candidatar-se. Tio Aloysio tinha uma memória privilegiada, sabia a arvore genealógica das principais famílias alagoanas; como também às datas de aniversario de todos os familiares e amigos, que fazia questão de ligar parabenizando.

Quando pequeno, adorava pedir-lhe a benção, pois toda vez, recebia uma nota novinha em folha, que ele costumava trazer consigo; era outra marca característica de sua pessoa.

Com o passar dos anos, como comecei a dirigir cedo e bem; acompanhei-o na sua segunda eleição como seu motorista; suas viagens eram incríveis, pois não tinha planejamento, saiamos e chegávamos nas casas de seus compadres e apoiadores alta noite ou pela madrugada; nessas viagens fiz amizades duradouras e, convivi in loco com a política, observando seus meandros, fato que me nortearam a jamais pertencer a qualquer partido político ou sequer participar ativamente de política, muito embora tenha havido imensas possibilidades.

A partir dessa eleição, passamos a ter um convívio efetivo; tinha umas manias interessantes, seu cabelo somente era cortado por um barbeiro de Palmeira dos Indios, adorava anotar tudo em suas cadernetas, não usava cuecas, gostava limpeza em seus mínimos detalhes, a gravata borboleta era uma marca registrada, chamava todos pelo nome, sabia conservar como ninguém suas velhas e queridas amizades, tinha pavor a traição, mas sabia perdoar; era um péssimo motorista; adorava jogar baralho, as vezes ia para a branca de Atalaia e passávamos a noite jogando de testa, não comprava cigarros mais jogando fumava muito, sempre cerrando dos parceiros. Participou de nosso jogo semanal, que até hoje acontece; ocorreu uma vez que teve um desmaio, sendo segurado pelo Vergette por algum tempo, neste ínterim, liguei para Jamille e Bilau, ficando de levá-lo para o hospital; mas, de súbito, voltou a si e sempre muito teimoso, continuou o jogo, não aceitando nossa sugestão . Dentre seus vários amigos, considerava Madeiro como seu irmão, o que era recíproco, estando seu quarto intocado até hoje na fazenda Carmelo em Jacaré dos Homens.

Foi quem me conseguiu o primeiro emprego no extinto IPASE, me apoiando sempre em minhas atitudes e conselheiro em todas as horas. Quando tive um escritório em Recife, sempre viajávamos juntos, mas para não perturbar ia no acento traseiro.

Sua família exemplar, adorava sua NINI e seus filhos José Thomás e Hercílio Neto, o afamado Biláu; Tia Eunice era a única pessoa que aventurava-se a andar com ele dirigindo. Na política, destacou-se pela ajuda aos municípios sertanejos, a ponte de Batalha, créditos no Banco do Brasil etc,  etc; mas ficou conhecido em Brasília, por ter queimado os móveis de seu apartamento funcional, ato noticiado na imprensa nacional; como Presidente do Ipaseal, construiu o prédio sede deixando sempre sua marca de bom gestor; era eleitor assíduo de Mano.

Nunca foi um bom caçador, mais adorava participar da folia; tinha uma excelente espingarda Santa Etiene; tendo morto um veado vermelho na Fazenda Riachão de seu compadre Mainha, como também marrecos na várzea da Boa Cica, em Penedo; fizemos varias caçadas juntos.

Depois de sua operação de próstata, quando precisou ficar na UTI da Santa Casa, aconteceu um fato inédito, pois adorou o barulhinho ti ti ti, era incrível o meu tio. Aposentado, passou a ser o motorista e acompanhante de Tia Eunice; porém, após varias batidas, teve de andar com um motorista, o que o deixou muito cabreiro e chateado.

Com a volta de seu câncer, faleceu na ocasião adequada, pois seria difícil sua estada em uma cama, face a sua agitação característica.