sábado, 28 de maio de 2011

MAIS UM CAUSO DOS AVENIDENSES por Paulo Ramalho


Acredito que final da década de l950, ou início da década de l960, não lembro exatamente a data.

Estávamos em uma festa no Clube Fenix, na Avenida da Paz onde até hoje sobrevive, no salão do andar de cima, palco das grandes festas daquela época.

Era um ambiente bastante familiar, uma vez que quase todos eram conhecidos.

Meu saudoso e querido pai Luiz Ramalho, residia na Avenida da Paz nº1 200, no bairro de Jaraguá. Ele era sócio remido do clube e tinha mesa permanente.

Próximo a nossa mesa ficava a de Benedito Bentes, também permanente, na intimidade Bené, casado com Dona Vega, pais dos nossos queridos amigos de infância, Luciano, o Gordo, de saudosa memória, Mardem, o Nego, Humberto, o Tinho, Eduardo, o Dudu e Geraldo, o Geo, todos Bentes, pois Bené morou quase vizinho a nossa casa, apenas uma nos separava. Porém na época que aconteceu o fato que a seguir vou relatar, já estava morando na cidade alta, no bairro do Farol, logo após a Praça do Centenário, início da Avenida Fernandes Lima.

O Clube Fenix contratou para animar a festa, Gilvan Chaves, não estou enganado ,não foi Juca Chaves e sim Gilvan um cantor de embolada.

Quando da apresentação o Gilvan Chaves vez por outra dizia que desta vez não ia acontecer como da vez passada, e o Bené dava a maior gargalhada, inconfundível por sinal.

Apenas os dois sabiam do que se tratava.

Lá para as tantas, o Gilvan pediu permissão ao Bené para relatar o fato, que foi consentido por um sinal afirmativo realizado com a cabeça.

Então o Gilvan Chaves começou dizendo que na vez anterior que esteve em Maceió, quando do final da festa Bené o intimou mediante um convite a ir a sua residência continuar a festa, dessa vez particular.

Já quase ao raiar do dia, Gilvan disse que ia embora, então Bené levou o Gilvan a uma sala próxima ao terraço em que estavam e mostrou um aquário com peixes de plástico, e perguntou se os peixes estavam nadando, Gilvan, como poderiam estar nadando se eram de plástico.

Ai disse o Bené, que somente sairia quando estivesse vendo os peixes nadando !

Foi quando ele deu a maior gargalhada em sua mesa, bem próxima a nossa.

Tempos bons.

PAULO RAMALHO – 05/2011

segunda-feira, 16 de maio de 2011

MENINOS DA AVENIDA por Murillo Mendes

Numa dessas sextas-feiras mágicas, exatamente nesta primeira do mês em curso, convidado, reencontrei-me, em almoço formal, com vários de meus amigos e companheiros da praia da avenida, mais precisamente da que fora a mais bela e incomparável de todas, onde nos exercitávamos através da prática de variados esportes, e nos preparávamos para a vida em sociedade. Alguns amores, também, ali, se iniciaram... Um deles, pelo menos, pleno e imorredouro, eu bem o conheço... A bucólica praia da avenida, de águas límpidas e areias nevadas, cintilantemente alvas, lamentavelmente, foi vilipendiada de modo irreversível, vítima de uma improvisada urbanização, irresponsável e predadora. Objetivamente, pela irracional mudança do curso do Riacho Salgadinho que, antes, desaguava na então afastada praia do sobral.

Compareceu a esse memorável encontro, pouco mais de uma dezena de avenidenses, com destaque para, dentre outros, os irmãos Carlito e Lelé Lima, Paulinho e Quico Ramalho, além de Valdo Wanderley, Cuca Lima, Geraldinho Gonçalves, Eurico Uchôa e Mozart Cintra que, não obstante residir na Avenida da Paz, se fez freqüentador assíduo da Praça Raiol e, mercê das raízes profundas e germinativas que ali fixou, converteu-se em um dos responsáveis pela estruturação e êxito da Confraria da Raiol, dirigindo-a por um decisivo e fecundo período.


Em considerações nem tão breves, expus a experiência vitoriosa da Confraria da Raiol, em todas as suas possíveis dimensões; de modo enfático, sob seu aspecto humano e social. Relatei que, antes da Confraria, nossos encontros eram anuais, normalmente em uma das churrascarias de Maceió... A partir de 1999, mudamo-nos, com ânimo de ficar, para o território livre da Praça Raiol, materializando essa atitude em reuniões familiares semanais, sempre aos sábados, além de uma grande confraternização natalina, realizada, sempre, na primeira quinzena de dezembro.

Assim, cuidamos do nosso Estatuto; iniciamos vida cartorial, transformando-nos em pessoa jurídica de direito privado; tivemos nossa Confraria reconhecida como de utilidade pública, através de lei municipal e, finalmente, graças, também, aos préstimos do então vereador Arnaldo Fontan, a Praça voltou a ser Raiol...

Sou dos que acham que o culto às sadias tradições, o permanente lembrar de nossos áureos e bem vividos tempos de jovens adolescentes não nos deprime, ou nos aprisiona, imobilizando-nos no passado. Pelo contrário, é o esquecimento dessas memoráveis experiências que responde pelo que somos, pelo que conseguimos ser, esse, sim, ao expulsar de nossas vidas e de nossas lembranças o encantado mundo em que nos nutrimos e crescemos, tornar-nos-ia estéreis, egoisticamente isolados, infensos aos sagrados liames da fraternidade.

Disse-lhes, por fim, o nosso segredo: - Os meninos da Praça Raiol, quase que nela moravam; desfrutavam-na, com avidez juvenil, em todos os dias. Éramos felizes e sabíamos de nossa felicidade. Também, tanto quanto os meninos da avenida, éramos donatários de um esplêndido naco da praia da avenida, justo o território praieiro frontal que ia da fabrica de mosaicos do Sr. Paulo Pedrosa até o casarão do Sr. Morgado. Nessa lúdica área, construímos uma quadra oficial de voleibol e um campo de futebol. Nela, igualmente ao que se dava na Praça Raiol, espraiamos nossas incontidas e indeléveis felicidades. Embora traquinas, entre nós, jamais medrou a delinqüência, pois que não alimentávamos o vício do ócio, o uso de droga, nem a rebelião contra a escola; éramos ligados aos exemplos de virtude, respeitosos com nossos pais e atenciosos com os professores e idosos.

Murillo Rocha Mendes
(Membro da Academia Alagoana de Cultura)

terça-feira, 10 de maio de 2011

AMIZADES DE INFANCIA por Cuca

Uma coisa que eu prezo e sempre que possível tento dar sustança, são as amizades que tive na infância e adolescência, mesmo porque ocorreu uma total mudança de conceitos e valores , com divergências gritantes entre a nossa e essa geração atual.

Na nossa infância, tivemos o privilégio ser livres, leves e soltos na expressão ampla do termo.Nossas amizades tinham robustez, convivíamos todo dia e nossos exemplos eram de solidariedade, confiança mútua, ajuda recíproca e respeito aos mais velhos indiscriminadamente; éramos como irmãos.

Nossos interesses, se existiam, eram ingênuos, mas às amizades feitas depois desse período, por melhores que sejam, sempre existe um interesse; aí reside a grande diferenciação.

Como exemplo, posso citar o caso do Grapete e do Biu, ambos faziam parte de nossa turma, mas como não situação financeira igualitária, ficava por nossa conta, o cinema, o sorvete e demais despesas que realizávamos em conjunto.

Existia muita briga entre nós; principalmente pelas disputas em jogo de botão, partidas de futebol, trincheira etc, mais breves; eu e o gordo Luciano brigávamos sempre, havia os incentivadores meus e do gordo, porém à noite já estávamos de bem, para voltar a brigar no outro dia . Eu e nego Lelé vivíamos nos chamando de “irmão da Rosita” e “irmão da Bebé” porque “de mal”, ou seja, brigados, podíamos jogar, brincar, etc. porém não podíamos pronunciar o nome do outro.

A turma era coesa, nos desentendíamos, mas não aceitávamos qualquer interferência de terceiros, como a da praça Rayol, da Sinibú etc.Daí dar origem a litígios entre às turmas. No São João já era tradição nosso enfrentamento com a turma da Praça Sinibú, na base dos tiros de combate e bombas; nosso maior fornecedor era o Dr. Bené que comprava caixotes de fogos para os filhos, principalmente tiros de combate,sempre solicitado por Luciano e irmãos, nosso arsenal . Logicamente que nossos pais não sabiam que os fogos que compravam era para as disputas.

Nós invadíamos a Sinibú, botando a turma de lá para correr e vice-versa; lembro-me de um caso interessante nessas pelejas, ao sermos atacados por aquela turma, nessa oportunidade, estávamos prevenidos e conseguimos botá-los para correr pela praia e para o azar deles, o salgadinho estava cheio, o que os obrigou a jogar seus fogos na água e prosseguir nadando sob nosso fogo serrado. Nessa ocasião Alberto lançou um foguete sobre o Dimas que raspou a cabeça, e ele ficou tempão com uma facha sem cabelo na cabeça.

Foi a nossa grande vitória, pois alguns deles, ao chegar em casa todo molhados, receberam uma sova dos pais; foi a glória, o boato correu solto entre várias turmas.

Ao contar esse fato, pretendo principalmente demonstrar a total diferença entre as turmas e as atuais Ganges; nas turmas não existiam armas de qualquer natureza, brigávamos a muque, não existiam inimizades sérias, pois após as disputas encontrávamos para discutir os acontecimentos, daí as gozações que faziam parte do cotidiano.

Na Avenida havia duas turmas bastante distintas, os maiores e dos menores, da qual fazíamos parte. Os maiores dificilmente deixavam que participássemos de seus encontros, com exceções do Helio Miranda que era nosso técnico, Diacuí, Alberto, Waldo e Rafael Perrelli que eram intermediários, os outros achavam-se em nível superior, só ocorrendo maior integração em nossa adolescência que passamos a sair juntos.

Para caracterizar esta diferenciação, contarei um fato ocorrido que atesta a situação; quando fizemos o roubo histórico da cabra Margarida, para os festejos juninos, soubemos que a turma dos maiores queria subtrai-la de nós, então providenciamos uma espingarda 32, carregamos dois cartuchos de sal para atirarmos na bunda dos novos ladrões; deixamos a Margarida pastando tranquilamente no quintal do Euricão e ficamos de tocaia nas bananeiras.

No começo da tarde aparecem Betuca, Nequito, Leo e Ciridião no muro da casa de tia Zeca, o Beta já tinha colocado a perna para pular, mas Leo previdente, diz, Beta esses meninos não deixariam essa cabra de bobeira, é fria, vamos embora, após muita discussão, desistiram sob protesto do Betuca. Nas bananeiras o Emilio estava ansioso, pois tinha ganho na porrinha o direito dar o tiro de desagravo, o que graças a Deus não aconteceu.

Conversa tem perna curta, Betuca soube do que escapou e, como vingança, no domingo seguinte reuniu os maiores e quando fomos tomar banho de mar, nos pegaram e tiraram nossos calções, deixando todos nus dentro d’água, colocando as peças no alto da amendoeira. Só no final da tarde o Emílio foi buscar nossas roupas; deixamos de almoçar e levamos uma enorme bronca de nossos pais.

Durante o verão, todas as noites após o jantar, nossas mães sentavam na porta para tomar fresca e fofocar e nossos pais ficavam nos bancos na avenida batendo papo; nós aproveitávamos para brincar de garrafão, rouba bandeira, ximbra, pinhão ou de cowboy no coreto. Pontualmente as dez horas todos se recolhiam.

Longe se sermos santos, muito pelo contrário, mas a não ser a brincadeira de dar dedadas que era de mal gosto, éramos por demais inventivos, sem qualquer apelação para a violência, humilhação ou safadeza

Naquela época, viado era nome feio, existindo discriminação mesmo, inclusive nossa turma não os aceitava, era no cacete, com exceção de um que protegíamos por fazer parte da turma.

Não me lembro quem iniciou, mas foi genial, contávamos que o Celite estava espalhando na cidade que a pessoa tinha tirado as calças e sentado no seu colo por várias vezes, que ele era funcionário do Centro Metalúrgico, loja por demais conhecida, localizada no centro do comércio. Foi um Deus nos acuda, o Sr.Agnaldo que era um chato, não agüentava mais de informar que não tinha nenhum Sr. Celite como funcionário à pessoas alteradas, deu briga feia e cadeia. CELITE era uma marca popular de vaso sanitário.

Outra brincadeira bacana da turma foi de iniciativa do Emilio. Todo ano, o dr. Helio Gazzaneo fazia uma festa de natal em sua casa e fazia a entrega de presentes; o Papai Noel era um irmão de D. Maristela e responsável pela entrega, retirando os presentes de um saco vermelho.

Como seus filhos faziam parte da turma, os menores eram convidados e Dr. Hélio comprava um presente para cada. Acontece que ao jogarmos bola no quintal, onde havia um dos nossos campos de bate bola na véspera da festa, o Emilio viu quando levaram grande quantidade de pacotes para um quarto que ficava junto da sala de visitas (existia naquela época) e, me chamou juntamente com Lelé para nos escondermos até o final da tarde, quando os donos da casa saíram, então munidos de uma caneta subimos no telhado, destelhamos no citado quarto e pulamos para dentro, onde trocamos os nomes dos presenteados pelos nossos. Não deu outra, foi um vexame, pararam a distribuição, mas ao final devolvemos os presentes.

Outra idéia genial, foi a criação de uma rádio no colégio Guido para filarmos a prova de química do Professor Gelio Medeiros no primeiro ano cientifico. Nessa brincadeira, da turma só participaram eu e Emilio que estudávamos naquele colégio.

Tínhamos o clube Avenidense, mas fundamos outros que não prosperaram para os campeonatos de botão, de 2x2 no coreto dentre outros; mas freqüentávamos o Clube Fenix, onde jogávamos futebol de salão, vôlei e basquete, mas o grande feito da turma foi a vitoria contra o Tenis Jaraguá no primeiro jogo de futsal realizado em Maceió, no ginásio da Fenix, onde fizemos a preliminar do jogo da seleção alagoana de basquete contra Pernambuco, nesse jogo ganhamos por 3x2, sendo nossos gols de Esquerdinha, Biriba e Lelé.

Nesse tempo não existia qualquer tipo de drogas; a primeira vez que tivemos ciência aconteceu, quando já adolescentes, estávamos jogando bola no coreto, e fomos avisados que tinha um maconheiro debaixo da ponte do salgadinho. Seguimos para lá e encontramos um indivíduo com aproximadamente vinte e tantos anos com os olhos vermelhos e arregalados, deitado e vomitado. Esse quadro grotesco, livrou-nos da aproximação ou interesse pelas drogas.

Três locais foram de grande importância para a turma. O sítio do Taboleiro dos Martins do Dr. Ulisses Braga, onde nas férias íamos com freqüência, ficávamos instalados num prédio anexo a casa, onde às vezes juntávamos mais de dez meninos. Tinha um bom campo de futebol e frutas de toda espécie, não esquecer as disputas de Jogo Imóbiliário, War, damas etc.

Quem tomava conta da turma era a Marina, irmã do Luiz Policarpo, empregada de extrema confiança da família, que terminou seus dias criando também os filhos do Felipe.

O Engenho Mataraca também recebia nossa visita, principalmente eu, Emílio e Lelé, onde desfrutávamos de andadas a cavalo, caçadas e pescarias. A noite íamos para Atalaia, onde começamos as paqueras, os guerreiros e zona de meretrício.

E a casa de Tio Mario e Zeca que era uma verdadeira pensão, sempre tinha comida à nossa disposição, a turma dos maiores eram quem mais aproveitavam, inclusive, o Aurino Malta a chamava de Mãe Zeca. O doce de mangaba era irresistível.

Atualmente inimaginável, Dr. Ulisses , D. Creuza com Marina , Tio Celso , Tia Liéne e tios Mario e Zeca recebiam uma cambada de meninos sem qualquer problema; inclusive, éramos tratados iguais a seus filhos, tudo nos era oferecidos com o maior prazer; havendo em contrapartida a total confiança de nossos pais; era um outro mundo.

Isto, para dar exemplo, pois havia outras casas que também freqüentávamos como a do Bené Bentes no farol, a do Melé na Mangabeiras dentre outras.

Tudo o que é bom tem um fim, começou a desmembrar com a mudança do Luciano e seus irmãos para o Farol; depois a preparação para o vestibular e por aí foi.

As amizades de infância foram substanciais e continuam até hoje à prosperar e engrandecer.

Infelizmente nossos filhos e netos não conseguiram estabelecê-las, pois com a proliferação da violência, das drogas, da insegurança; restando para eles os colegas de colégio, de prédio etc., o que é uma pena.

O mundo mudou, juntamente com seus conceitos, necessidades, confiança, solidariedade, apareceu a malfadada TV ensinando tudo o que nefasto, trazendo aos lares uma visão maléfica das minorias.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

FOTOS ENCONTRO maio2011 - MURILO MENDES


ENCONTRO DE 6 DE MAIO DE 2011 - Candelábrio - FENIX
CONVIDADO: MURILO MENDES
COMPARECERAM: PAULO E QUICO RAMALHO, CESAR CARNEIRO, CARLITO, LELÉ, CUCA, GERALDINHO, MOZART, WALDO, EURICO

quinta-feira, 5 de maio de 2011

SEU RODOLFO por Alberto Cardoso

Referencia: Blog dos Meninos da Avenida
Registro de lembranças: Alberto Cardoso Correia Rêgo ( período 1955 a 1959 na Av. da Paz)
Personagem: Velho Pescador Sr. Rodolfo. ( meu grande amigo)

Avenidenses : Passo a descrever alguns fatos e passagens de momentos felizes dos meninos da avenida , associados ao velho Pescador que conviveu com a nossa comunidade da Av da Paz , rua Silvério Jorge e imediações, com a venda de peixe fresco, pescado ali em frente as nossas casas e próximo do porto de Maceió, nos idos de 1955 a 1959.

Pescador Seu Rodolfo.

Pescador aposentado sem INSS ,sem renda fixa, casado com dona Santa tinha 2 filhos , sendo um adolescente sem emprego e outro de menor,uma família muito pobre que habitava um pequeno barraco as margens do rio Salgadinho numa propriedade de coqueiros por trás da rua Silvério Jorge. Embora moço apresentava um grave problema de saúde com uma enorme hérnia , tendo de usar uma sunga permanente para evitar estrangulamento e ter que ser socorrido no proto socorro, tinha fases críticas quando fazia algum esforço físico, pesos, andar grandes distancias,dias e dias doloridos, ou seja , debilitado para a maioria dos trabalhos.

Chegamos a fazer um campo de futebol nessa propriedade plantada de coqueiros próximo do barraco do Seu Rodolfo,onde jogamos várias peladas sempre na parte da tarde e depois tirávamos ( roubávamos )cachos de côco para matar a sede que ninguém é de ferro, e de certa forma pedíamos emprestado a foice para facilitar as aberturas dos mesmos. Dessa maneira ficamos familiarizados com essa família. A nossa única preocupação era na hora de roubar cocos observar o vigia dessa propriedade cuja casa ficava do outro lado do rio Salgadinho onde o mesmo tinha uma espingarda com tiro de sal, que para chegar ao nosso local teria que correr muito rápido e atravessar a ponte de ferro o que dava tempo suficiente para a turma se picar. De longe já longe da mira da tal espingarda , gritávamos a plenos pulmões, vigia fdp, filho de rapariga e em seguida com os buchos cheios de água de coco descíamos para a praia tomar banho de mar até escurecer.

Seu Rodolfo ficava com sua cesta vazia observando o lance das redes dos pescadores, seus ex- companheiros de profissão e assisti muitas vezes o chefe da pescaria selecionar os maiores peixes e fazer um sinal para Seu Rodolfo colocá-los em sua cesta e partir para comercialização. Muitas vezes seus olhos se enchiam de lágrimas de alegria por aquele gesto do também pescador pois estava dando-lhe chance de ganhar uns trocados na comissão pela venda dos peixes e conseguir adquirir comida para os seus. Quando a pescaria não dava peixes grandes, o pescador chefe apanhava um bom punhado de peixes e piabas e colocava-os na sua cesta que serviriam para aliviar a fome da família. Seu Rodolfo muitas vezes saia de mãos abanando , com a cesta vazia mas nunca presenciei o mesmo reclamar ou mesmo pegar peixes sem autorização do chefe da pescaria.

Seu Rodolfo subia a praia e começava sua peregrinação pelas nossas casas onde nossas mães compravam logo aqueles peixes frescos , pesando-os em suas próprias balanças e pagavam o valor cobrado sempre agradecendo e encomendando para a semana seguinte, de tal modo que em pouco tempo ele já podia prestar contas com o pescador chefe e ficar com sua comissão. Em dias de sucesso como este, com dinheiro nas mãos se dirigia para a venda de Seu Nelo ( pai de Mi e de Zito) esquina da rua do Uruguai para comprar mantimentos que mandava para casa por seu filho e aproveitava para tomar umas cachaças ( chamava de gornopes) e virava um boêmio de marca maior, cantava com voz forte e entoava canções que gravei na memória de tanto ouvi-las. Trazia consigo um violão e se sentava a noitinha em um meio fio encostado num poste com luz . Os meninos da avenida iam chegando para assistir aquele artista improvisado e quando eu chegava próximo ia logo dando bronca reclamando porque ele tinha bebido demais e ele calmamente dizia Betinho, ele sempre tratava os meninos pelo diminutivo, tomei uns gornopes não nego, tive um dia muito complicado, mas prometo que não vou beber mais. Nós ameaçávamos de não mais ajuda-lo se ele continuasse bebendo os seus gornopes mas no íntimo queríamos resguarda-lo de sua saúde.Veja a sensibilidade do Seu Rodolfo com a letra de uma das músicas que sempre cantava, com voz firme e entoada acho que é anterior ao período do cantor Orlando Silva, e que gravei na memória e canto ainda hoje, sempre em momentos de recordação dos nossos tempos de infância felizes:” Meu grande Amigo”.

Escuta meu Grande Amigo
Preste atenção no que lhe digo
Vim despedir-me de Ti

Meu Amigo até agora
Não sabia que Eu ia embora
Por causa de uma mulher

Trocamos um abraço forte
Desejo-lhes boa sorte
Incontinenti partí

Para não cometer um erro
Preferí esse desterro
Com toda resignação

Para Ele a vida é bela
Hoje Ele vive com Ela
E Ela no meu coração.

Observo que tal qual a letra a música é muito bonita , adaptada para violão, do tipo romântica roedera.

Algum tempo depois Seu Rodolfo, conseguiu um terreno a beira mar numa colônia de pescadores em frente ao porto de Maceió e quando íamos para sua casa pele praia passávamos por debaixo do trapiche (nosso mini paraíso para pular e tomar banho de mar com a maré cheia). Desmontou seu barraco antigo do Salgadinho com ajuda de vários meninos da avenida e aproveitou para construir a nova morada. Conseguimos arrecadar dinheiro compramos tijolos , telhas e outros materiais de tal modo que a nova casa ficou muito melhor em todos os sentidos que o barraco anterior que era isolado sem qualquer vizinhança. Seu filho mais velho já trabalhava e tinha uma boa carroça e era um bom pedreiro que ajudou na construção da nova casa.

Várias noites após o café os meninos da avenida se reunião no banco da praça junto ao Coreto e partíamos para a casa do Seu Rodolfo pela praia e logo após passar por baixo do trapiche chegávamos nas proximidades e no escuro fazíamos o anúncio de nossas presenças então ele gritava de alegria : Santinha ou Santinha veja quem chegou ,os meninos, vamos entrar e sentar a mesa para tomar a sopa de peixe que era servida mesmo afirmando que já estávamos de barriga cheia , a nossa recusa não era aceita e tomávamos aquela sopa de cabeça de peixe.As nossas mães sempre mandavam por nós ,alimentos , dinheiro e roupas , deixando Seu Rodolfo e dona Santinha bastante felizes.

Nos anos 60 me transferi para Recife para cursar engenharia e nessa fase da vida as brincadeiras vão sendo paulatinamente substituídas pela responsabilidade profissional e a nossa juventude desabrocha em inúmeros sonhos, queremos resolver tudo, participar de tudo, resolver os problemas do mundo, cuidar dos amigos , da política, formar família e quando vamos dar conta de como estão nossos contemporâneos que ficaram somos surpreendidos pelas mudanças que o tempo realiza implacavelmente. Digo isso porque aconteceu comigo e senti como se culpado fosse quando um dia a Dona Santinha chegou no apartamento de minha mãe , na Pajuçara , bem velhinha, exatamente no dia que eu estava em Maceió e ao ir embora disse que Seu Rodolfo estava morando na ponta da terra , não andava mais , ficava na cama ou sentado e que eu fosse visitá-lo quando quizesse, o que não aconteceu. Infelizmente a vida é assim. Felizmente porque mantive na memória a sua imagem de quando era um bom artista.

Recife,4 de maio de 2011