domingo, 13 de dezembro de 2015

O VÔO DO SEU PORTELA por Carlito



O fato aconteceu na praia da Avenida da Paz. Apareceu em Maceió um português fazendo demonstrações aéreas com um avião teco-teco. Seu proprietário fazia apresentações em todas as cidades que passava, vivia desse biscate.

     O avião de nome Garoto decolava e pousava na praia da Avenida durante a maré baixa, perto do Sobral, local mais deserto. Suas apresentações eram piruetas, parafusos, folhas secas e outras acrobacias.
    Como não podia cobrar dos expectadores que ficavam na praia observando, ele cobrava de quem se arriscava a dar uma voada com ele durante suas peripécias aéreas. Um de cada vez porque só havia um lugar além do piloto. Cada vôo de cinco minutos, o português cobrava cinco mil réis.
   Numa tarde bonita e ensolarada de verão, o português fazia magníficas exibições nos céus da praia da Avenida. O povo assistindo o espetáculo vibrava com o arrojo do piloto, uma maravilha de exibição.
     Entre os candidatos ao vôo surgiu Seu Portela, figura altamente conhecida na cidade, onde tinha uma loja no centro, na Rua do Comércio.
    Eram aproximadamente quatro da tarde quando chegou sua vez. O português colocou Seu Portela na poltrona, prendeu-o com o cinto de segurança, deu-lhe todas as recomendações e assumiu o comando do Garoto.
    Taxiou pela beira da praia de areia dura e extensa, tomou velocidade e decolou em direção ao mar. Rapidamente atingiu a altitude necessária e iniciou as acrobacias aéreas.
   Não demorou muito. Após um arrojado “looping”, deu sinal que estava retornando à praia. Os inúmeros expectadores acharam estranho. Por quê em tão pouco tempo o Garoto retornava ao solo? Seria alguma complicação mecânica? Alguma pane? O teco-teco estava a perigo? Eram as perguntas que faziam entre eles. Formou-se maior expectativa.
    O avião pousou abruptamente e de repente o piloto desembarcou, deixando seu Portela na aeronave.
    O lusitano gritava em direção ao povaréu apreensivo que estava plantado na Avenida, perguntava se alguém dispunha de uma capa para emprestar-lhe, pois havia uma situação de emergência.
    Quem teria, numa tarde maceioense ensolarada de verão, na beira da praia, uma capa para emprestar a quem quer que seja?
    Com a resposta negativa, o português buscou uma alternativa e conseguiu com um pescador que morava em uma casa de taipa e palha ali próxima, um pedaço de pano, ou melhor, uma rota vela de jangada.
      Com o trapo na mão o piloto retornou correndo à aeronave, ajudou o seu Portela a desembarcar e envolveu-o com o velho molambo, levando-o para um local onde conseguiu meios para que o levassem rapidamente para sua residência. Nessa altura a moçada perguntava o que teria ocorrido.
    Acontece que por onde seu Portela passou, entre o avião até a Avenida, deixou um rastro líquido e escuro na areia branca da praia, juntamente com uma catinga, com o fedor de merda, insuportável para quem estava mais próximo.
   Sem esconder, o nobre piloto português contou a história: Assim que levantaram vôo, o seu Portela num grito pediu para descer. Como o piloto já estava preparado para o “looping”, não atendeu aos pedidos e deu aquelas voltas com o teco-teco se curvando no ar, enquanto o acompanhante gritava de medo. Só depois do português ouvir seu Portela gritar que estava todo cagado, ele resolveu aterrizar.
    Foi uma gargalhada geral, os comentários e as galhofas espalharam-se entre as pessoas presentes que estavam assistindo ao espetáculo e assim foi se espalhando na Rua do Comércio, em Jaraguá, no Farol, na Ponta Grossa. À noite Maceió todo já sabia da cagada do seu Portela no avião.
  Por vários dias que se seguiram o comentário era o mesmo, nas escolas, nos bares, nos lares, na zona, nas barbearias, o assunto era a aventura de seu Portela no vôo do Garoto.
    Os estudantes assumiram a chacota, passavam em  frente da lojinha de seu Portela na Rua do Comércio, se divertiam cantando uma modinha que um jovem compôs em alusão a desventura aérea do comerciante. Aliás, muito tocada no carnaval daquele ano:
                               “Marchinha do seu Portela”
                    Eu fui alegre
                    Passear de avião
                    Para mostrar
                    Que sou cabra valentão
                    Mas vejam só,
                    Que eu não posso andar voando
                    He He............
                    Estou me cagando, estou me cagando.
                    Portela não seja frouxo,
                    Não coma mais sururu
                    Quando subir no Garoto
                    Arroche as pregas do........”bolso”.

    Seu Portela tinha bom humor e levou também na gozação. Se importasse com o acontecido, até hoje, em seu túmulo o povo estaria gozando o seu inesquecível e histórico vôo nos céus da Avenida da Paz.

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

AVENIDA DA PAZ DOS MENINOS NOS IDOS DE 1950 por Paulo Ramalho



Estava no domingo próximo passado no Auditório do Instituto Histórico, participando do “Concerto aos Domingos”, idealizado, coordenado e comandado pela brava Selma Britto, assistindo a uma apresentação de uma grande pianista, quando chega o amigo irmão de infância Carlito Lima, senta ao meu lado e perguntou:

- Começou hoje às 9 horas?

E eu respondi:

- Não, começou no horário normal às 10 horas, já são 10:45 horas.

Ele olhou para o relógio e disse:

-Pensei que fosse 15 minutos para às 10 horas.

Então eu arrematei, arrancando sorrisos dele:

-Cuidado com o alemão!

Acredito que a chegada do amigo irmão de infância da Avenida da Paz, e a apresentação de pianista, veio à lembrança os carregadores de piano que passavam na avenida, com o piano na cabeça, protegida com uma rodilha de pano, cantando para não errar o passo, e não desafinar o piano.

Por que não lembrar também dos bondes que circulavam pela avenida, havia os de passageiros e os cargueiros, esses foram os primeiros saírem de circulação, tinham a laterais fechadas, apenas janelas na parte superior e porta de acesso, eram mais utilizados por pessoas com bagagens, cestas com compras efetuadas no marcado.

E os carregadores de malas e bagagens da Estação Ferroviária, como já consta em outro escrito, quando chegávamos das férias em União dos Palmares, pegavam nossas malas e bagagens e levavam para nossa casa, sem que tivéssemos que acompanhá-los.

E os vendedores de sorvete e picolé, que nos vendiam na avenida, na Rua Silvério Jorge, na praia, e depois iam receber o dinheiro em nossas casas.

O verdureiro, vendendo de casa em casa, uma variedade de verduras e algumas frutas.

O vendedor de peixe, fresquinho, pescado em jangadas ou nas redes lançadas ali defronte na praia.

As vendedoras de sururu de capote e despinicado.

O vendedor de massa puba a gritar:

-Massa puba é a boa.

O vendedor de beiju, grude, pé de moleque, tapioca, entre outros, feitos em Riacho Doce.

Os entregadores de leite, pão e bolacha que colocavam nas portas de nossas casas.

O engraxate que passava com freqüência em nossas casas, deixando nossos sapatos como novos.

O soldador de panelas.

O amolador de tesouras, tocando pequena gaita, anunciando sua chegada.

O comprador de jornal velho, garrafas e latas vazias.

O guarda civil que zelava pela paz na avenida.

Tudo isso o tempo acabou, mas não conseguiu apagar de nossa memória, tão bom foi aquele tempo.

Finalizo este texto saudosista com parte de um poema do “Poeta da Infância”, Cassimiro de Abreu, que assim escreveu: “Oh! que saudades que tenho, da aurora da minha vida, da minha infância querida, que os anos não trazem mais!(...)”.

Aos queridos amigos irmãos da avenida, beijo no coração de todos, e fiquem com Deus.
                         Paulo Ramalho-03/08/2015
                         Pramalho.castro@oi.com.br

terça-feira, 30 de junho de 2015

MÁRIO LIMA, O LEGENDÁRIO GENERAL DO POVO por Edberto Ticianeli

( BLOG historia de alagoas em fotos -  http://www.historiadealagoas.com.br)



Major Kleber, General Mário Lima e o governador Arnon de Mello


O jovem tenente Mário Lima

Mário de Carvalho Lima nasceu em Maceió no dia 24 de outubro de 1908. Era filho de Américo Araújo Lima e Amélia de Carvalho Lima.
Mesmo ingressando na vida militar muito jovem, o que normalmente tenderia a lhe dar uma formação disciplinadora e autoritária, Mário Lima desenvolveu um temperamento conciliador, mais para diplomata que para soldado.


Major Mário Lima

Ingressou em 1925 na Escola Militar de Realengo, no Rio de Janeiro. Cinco anos após era declarado aspirante à oficial e designado para o 5º Regimento de Infantaria em Lorena­, São Paulo.
No ano seguinte, em 1931, chega a 1º tenente e passa a servir no 20º Batalhão de Caçadores, em Maceió, onde retorna ao convívio da família e dos amigos. Em 1932, embarca com o 20º BC com destino a São Paulo, onde participa da mobilização militar que sufocou a chamada Revolução Constitucionalista.
Por ter saído heroicamente da sua trincheira e socorrido um soldado e um coronel feridos, que arrastou enquanto rastejava, foi convidado para ser Ajudante de Ordem de um general no Rio de Janeiro, para onde levou toda a família.


Família Peixoto Lima

Em 1934, casa-se com Maria José Peixoto Lima (Zeca), que se tornou a sua eterna companheira e com a qual teve cinco filhos: Rosita, Mario Humberto (Betuca), Carlos Roberto (Carlito), Américo José (Lelé) e Maria do Socorro (Socorrinho).
Com a deflagração do episódio que ficou conhecido como Intentona Comunista, em 1935, Mário Lima deslocasse com sua tropa para Natal, onde enfrenta fogo cerrado e perde seu amigo sargento Jaime Pantaleão, alagoano de Pilar. Foi Delegado da DOPS em 1937.


Comandante do 20º BC, coronel Mário Lima

Em 1939, compra a casa da Rua Silvério Jorge, em Jaraguá, que teria sido de uma amante do governador Costa Rego e vai morar lá com a família. Carlito Lima, seu filho, lembra assim da casa: “sempre festiva e aberta aos amigos, muitas vezes funcionou uma espécie de exílio de perseguidos políticos a boêmios desamparados”.
Já capitão, em 1944, Mário Lima foi transferido do 20º BC para Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais no Rio de Janeiro. Um pouco antes do final da Segunda Guerra, em 1945, foi estagiar no The Infantary School Fort Benning, nos­ EUA.


General Mário Lima

Em 1946 é promovido a major e regressa ao 20º BC em Maceió, quando consegue se formar pela Faculdade de Direito. No início do governo de Arnon de Mello é chamado a assumir o comando da Polícia Militar.
No período entre 31 de março de 1952 e 6 de dezembro de 1954 assume o comando do 20º BC. No final do governo de Arnon de Mello, no dia 2 de junho de 1955, lhe é entregue a Secretaria de Estado dos Negócios do Interior, Justiça e Segurança Pública. Foi ainda Comandante da Guarnição Federal em Alagoas.


Mário Lima presidente do Orfanato São Domingos

Mário Lima ainda dirigiu a TELASA e teve participação atuante em sua comunidade. Dirigiu clubes sociais e esportivos, como o CRB e Fênix Alagoana. Foi ainda diretor do Orfanato São Domingos e provedor da Santa Casa, entre outros.
Foi presidente da Federação Alagoana de Desportos, juiz de futebol, diretor do Lions e Rotary. Era também reconhecido como excelente professor de matemática. Como escritor, era membro do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas e recebeu o prêmio Jayme de Altavila da Academia Alagoana de Letras.


Mário Lima também foi provedor da Santa Casa de Misericórdia de Maceió

O general Mário de Carvalho Lima faleceu em Maceió quando tinha 84 anos, no dia 6 de janeiro de 1983.

Obras:

Floriano e Barroso, Maceió, 1939.
Sururu Apimentado, Apontamentos para a História Política de Alagoas, apresentação de Franklin Casado de Lima e Paulo de Castro Silveira, Maceió, EDUFAL, 1979.
A Revolução de 1930 em Alagoas, Revista do IHGA, v. 31, 1974-1975, Maceió, 1975, p. 31-57.
Plácido de Castro o Libertador do Acre, Revista IHGA, v. 32, 1975-1976, Maceió, 1976, p. 135-148.
Participação de Alagoas no “Trampolim da Vitória” – 2ª Guerra Mundial – 1941/1945, Revista do IHGA, v. 33, 1977, Maceió, p. 45-91.
Assembléia Constituinte Estadual de 1935 Agressiva Campanha Política para Eleição Indireta do Governador do Estado, Revista IHGA, v. 36, 1980, Maceió, 1980, p. 43-68.

Fontes:
ABC das Alagoas.
Blog Meninos da Avenida.
Várias entrevistas e crônicas do seu filho Carlito Lima.
Site do 59º BIMtz. http://www.59bimtz.eb.mil.br/index.php/comandantes.
Arquivo pessoal de Américo “Lelé”, seu filho.


Coronel Mário Lima, Théo Brandão e Carivaldo Brandão na operação salvamento do Gogó da Ema em 1955


Capa do livro Diário de um soldado alagoano no front da Revolução de 1932


Capa do livro Sururu Apimentado