segunda-feira, 29 de junho de 2009

O MAIOR ESPETÁCULO DA TERRA por Lelé










Não me atreveria aqui a discutir ideologia ou regime político do quadro atual de Cuba, nem tampouco descrever a magnífica viagem que fizemos toda a família à ilha, percorrendo-a de carro quase 4 mil quilômetros em três semanas, visitando cidades coloniais belíssimas e praias paradisíacas com direito a mergulhos em corais maravilhosos.


Desejo apenas relatar o meu momento mais sublime dessa viagem.


Dia 9 de junho, terça-feira, cinco e meia da tarde, sol ainda forte, 35 graus, chegamos a velha Santiago de Cuba, a mais africana, musical e apaixonante cidade de Cuba, berço da Revolução. Pelas ruas estreitas procurávamos hotel. Calle Heredia. Calle Enramada. De repente um enxame de roupas vermelhas com lenços azuis ou vermelhos no pescoço. Eram os estudantes primários voltando para casa.


Centenas deles. Alguns de mãos dadas com suas mães ou avós, na garupa da bicicleta do pai, mas a maioria desgarrada, brincando, dançando, chupando sorvete, gritando, fazendo algazarra. Numa situação inusitada de alegria. Felizes como pintos no lixo.


Sentei-me no meio fio, com uma Bucanero na mão, cerveja forte e gostosa, e fiquei apreciando aquele movimento de estudantes, sublime como uma procissão, se arrastando feito cobra. Esse sim, o maior espetáculo da terra. Confesso que lágrimas desceram. Fiquei com uma esperança engasgada no coração.


Em Cuba, um pais pobre, que vive principalmente do Turismo e da agricultura, a população passa aperto para garantir suas crianças na escola em tempo integral. Entram as 8:00 e saem às 5:30. E isto é uma rotina sagrado. Todos que conversamos foram unânimes em não abrir mão desse direito. O estudo é obrigatório até ao equivalente nosso 2º. Grau.


Cheguei a Maceió, dia 22, segunda-feira, depois de uma viagem puxada Havana-Bogotá-Manaus-São Paulo-Maceió. Mesmo assim fiz questão de ligar a TV Gazeta prá assistir as noticias locais. Numa reportagem, uma menina de 5 ou 6 anos, com as mãozinhas sujas de pólvora, ajudava a mãe na fabricação de bombas juninas. Confesso que lágrimas desceram. Voltei a ficar com um desânimo, uma impotência engasgada no coração.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

CAPIXABA por Carlito Lima

Osvaldo Carlos do Rego Couto, era seu nome pouco conhecido, todos lhe chamavam de Capixaba. Amigo de juventude nas areias brancas da praia da Avenida da Paz, excelente ponta direita do Avenidense Futebol Clube, o xodó das meninas, cuidava de seu físico como um bom narcisista. Desde cedo gostou de boas mulheres, bons papos, inteligência e raciocínio rápido lhe davam o toque de bom humor e alegria.
Há alguns anos morava em Brasília, nunca perdemos o contato, sempre gentil, quando vinha às Alagoas trazia presentes para os amigos. Conquistava a todos pela simpatia e alegria, um ser humano de bem com a vida. Na última vez que almoçamos juntos, festa de fim-de-ano do Cáo, relembramos grandes noitadas, aventuras de jovens cheios de sonhos e de irresponsabilidades. A vida de Capixaba dá um livro bem humorado.
Certa vez estávamos fazendo o passo na Avenida acompanhando o Bloco Cavaleiro dos Montes, era uma manhã quente de Banho de Mar à Fantasia. Ao tocar o Vassourinhas a moçada enlouqueceu, de repente Capixaba recebeu uma cotovelada na cara, desmaiou. Ao recuperar-se soube quem era o agressor, nada menos que Porreta, um baiano, alto, forte, arruaceiro de puteiros, certa vez bateu em três policiais. O marginal mais conhecido nas baixas rodas da zona de Jaraguá, não só por ser briguento, também por um pequeno detalhe, era uma tremenda bichona, a Madame Satã de Maceió. Todos tinham medo de Porreta, viado macho para ninguém botar defeito. Capixaba inconformado o desafiou para um duelo a muque, dali a um mês, no centro da Praça Sinimbu. Porreta topou a parada, marcaram a data, hora e local pelos intermediários.
Nosso amigo começou a preparar-se para grande luta; boêmios, putas, até a polícia sabia do desafio, a moçada ficou na expectativa. Capixaba diariamente corria do coreto da Avenida até o Morro Tom Mix, onde hoje é a Brasken.
Naquela época, Nezito Mourão, um dos maiores beques do Brasil, jogou no Santos de Pelé, canpeão do mundo em 61-62, havia aberto uma Academia de Boxe, Capixa se matriculou, recebia aulas técnicas de murros e defesas. Certa vez os dois “brigavam” em treinamento, Capixaba de repente aproveitou uma guarda aberta de Mourão, deu-lhe um soco no olho, o crioulão na hora tentou dar o troco no indisciplinado aluno, ele saiu correndo, foi bater em Marechal Deodoro. Fazia parte do treinamento.
Certa manhã, Capixaba avistou dois marinheiros ingleses andando na Avenida da Paz em direção ao cais do porto, ele gritou “Son of bich”, os marinheiros não gostaram, continuaram a caminhada, Capixaba correu atrás, provocando deu uma tapa em cada um. Começou uma briga de cinema, dois contra um. Lutaram até cansar. Assim foram os treinos para enfrentar Porreta, a Madame Satã.
Finalmente chegou a noite esperada. Alguns amigos acompanharam nosso herói até a Praça Sinimbu. Ao se aproximar ouviu do boiola: “Preparou-se para levar a maior surra de sua vida?”
Tiraram o relógio, a camisa, os assistentes formaram um círculo deixando os dois lutadores no centro. Aconteceu uma das maiores luta já presenciada nas Alagoas e alhures. Primeiros movimentos, adversários se estudando, alguns ataques, outras defesas, jogo de pernas. De repente rápidos murros, socos na cara, na barriga, às vezes se atracavam, se soltavam, não havia juiz para separar que nem o boxe. Esmurraram-se, se digladiaram por mais de uma hora, suavam, sangravam. Estavam cansados, Capixaba bobeou em sua guarda, Porreta aproveitou, acertou um soco desconcertante na cara, nosso amigo caiu no chão, jorrando sangue pela boca. A raiva subiu para cabeça, Capixaba num ímpeto incomunal levantou-se inesperadamente dando uma cabeçada no peito do distraído Porreta que rodou em queda para trás, caiu de costas. Ato contínuo, num pulo de gato, Capixaba montou por cima de Porreta esmurrando-o incessantemente. Retiraram Capixaba de cima de Madame Satã nocauteado, sangrando, levaram para o Pronto Socorro, faltando três dentes. Assim acabou o reinado de Porreta, o viado baiano mais macho do Brasil.
Capixaba, nessa última semana, também acabou seu reinado nesse mundo. Ao morrer um amigo vai-se um pedaço da gente, as lágrimas, a tristeza, os sinos dobram por todos nós, Capixaba. Resta agora, contar suas histórias, ou dançar um tango.

quarta-feira, 24 de junho de 2009